Tempo da Existência

Sinto o tempo passando por mim e de alguma forma me moldo a ele; quantas vezes tanto eu como meus pacientes tivemos percepções como estas?

Penso que existem diversas formas de vivenciar o tempo, uma delas é viver o tempo cronológico, o tempo do dorme e acorda (como às vezes explico para meus pacientes pequenos), aquele que de alguma forma molda meus dias em manhãs, tarefas, tardes, tarefas e noites dormir.

Este tempo fica imutável, cercado de vivências comuns, cotidianas e superficiais. Nas quais não consigo transcrever quem sou, o que penso, reflito, quero, busco, sinto. Mas, que me carrega dia após dia, mês após mês e ano após ano, a uma vivência simples, comum.

Busco junto a meus pacientes, encontrar o tempo talvez do coração, no sentido mais subjetivo mesmo, o tempo dos meus sentimentos, aquele que consiga traduzir minhas verdades, escolhas, pensamentos.

Um tempo que não consegue ser mensurado de forma comum, mas que apenas as vivências realmente sentidas podem transmutá-lo. E que cada um de nós tem o seu, ele não é comum, simples, mas sim, intenso, forte, cúmplice. Que cure minhas dores, dê novos significados a meus vazios existenciais, envolva minha história em um colorido só meu.

As experiências compartilhadas muitas vezes me mostram que ele existe, de alguma forma ainda busco encontrá-lo, em alguma vivência simples e sutil.

Temos dias em que não queremos levantar da cama, dormimos mal porque ficamos pensando na vida e nas dificuldades de viver, ou queremos ficar quietos sem conversar com ninguém ou fazer nada.

Faz parte de nossa natureza nos isolarmos em alguns momentos para refletirmos ou descansarmos; mas e quando estes momentos são mais constantes do que os que estamos de bem com a vida, com disposição para o que vier?

Talvez nesses momentos vivenciemos a palavra mais usada neste século, ou melhor, conhecida como o mal do século, a depressão!

Ela é vivenciada na totalidade do ser humano, no corpo, na mente, nos sentimentos. Não devemos distanciá-la de crises e vivências. Temos que ir fundo dentro dela e compreendermos qual é a nossa depressão, por que estou assim.

Os sintomas da depressão são muito variados, indo desde as sensações de tristeza, passando pelos pensamentos negativos até as alterações da sensação corporal como dores.

São comuns os relatos em que a pessoa sente que sua vida está passando sem que ela faça nada, como se estivesse sentada na areia da praia vendo sua vida passar como um navio no mar, distante.

O mais importante é saber como a pessoa se sente, como ela continua organizando a sua vida (trabalho, cuidados domésticos, cuidados pessoais com higiene, alimentação, vestuário).

Além de medicamentos, a pessoa com depressão precisa de um acompanhamento terapêutico, no qual será percebida como além do rótulo depressão, mas como uma pessoa que de alguma forma está desajustada em seu tempo e que necessita falar e perceber seus sentimentos.

Crianças Ansiosas

Uma variável em nossa vivência temporal é a ansiedade, algo que nos tira do presente, nos faz viver o futuro, algo ainda não realizado, que não está pronto.

Tenho encontrado no consultório, em conversas com amigos que tem filhos e nos trabalhos voluntários com crianças que este tema é algo bem comum na infância.

A ansiedade é totalmente trazida por nosso tempo vivido, por nossa dificuldade de vivenciar o agora, é quando a projeção mental no futuro é mais forte do que no presente. A criança pode ter este comportamento aprendido dos adultos que a cercam, mas hoje há estudos que mostram que os genes também podem ter o seu papel nesse quadro. Uma pesquisa realizada por cientistas na Alemanha e nos Estados Unidos mostrou que pessoas com variações do gene que regula o neurotransmissor dopamina, o COMT, possuem mais chance de desenvolver distúrbios de ansiedade.

Mas a genética é apenas um dos diversos fatores que contribuem para a ansiedade. O ambiente, como o convívio em casa com a família, exerce uma função importante no comportamento da criança.

A criança ansiosa normalmente não se concentra no momento atual, vivenciando antecipadamente todos os seus sentimentos, sentindo muitas vezes fobias (medo de ficar sozinha, presa, pessoas, largar fraldas, chupetas), roendo unhas e cutículas, respirando e comendo rapidamente, podem ter náuseas, diarréias, vômitos, dificuldades de concentração.

O importante é que ao percebermos nossas crianças com alguns hábitos ansiosos, tentarmos revisitar nossas condutas, nossas atitudes podem causar ansiedade nelas, assim como ficar mostrando a elas o comportamento “ansioso” muitas vezes não ajuda, só agrava mais a ansiedade. Devemos avaliar se a ansiedade não está vinculada a alguma mudança repentina que a criança passou (escola, casa, separação dos pais), a perda de um ente querido, nascimento de um(a) irmaozinho(a).

Se a ansiedade não diminuir com a atenção e amor dos pais (ajudá-lo a se concentrar, criar momentos prazerosos), um profissional deve ser consultado, pois no futuro suas vivências podem ficar comprometidas pela ansiedade (fobias sociais, depressão, pânico).

Ao pensar em tempo, nos referimos muitas vezes ao tempo mecânico, o tic-tac do relógio que anuncia o passar do tempo, muitas vezes vivenciado de forma angustiante, entediada, apressada, dentre outras.

Pensando assim, temos o tempo como uma extensão de nós mesmos, não algo do mundo. Ele é consciente, mede e vivencia nossas experiências, ele é o Tempo Vivido.